A discriminação e as hostilidades entre alunos e professores nas escolas, a chamada violência interpessoal, aumentaram mais de 250% entre 2013 e 2023. Os dados são do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) e foram publicados este mês na Revista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). O artigo traz um panorama da violência nas escolas, desde a evolução dos números, passando pelas causas e apontando caminhos para a solução do problema.
Segundo o MDHC, as vítimas da violência interpessoal nas escolas aumentaram de 3,7 mil em 2013 para 13,1 mil em 2023. Nesse período, as ocorrências autoprovocadas, como suicídio e automutilação, quando a própria pessoa faz um corte em seu corpo, aumentaram 95 vezes. Já o bullying, ou seja, a repetida intimidação física, verbal ou psicológica, que atingia 30,9% dos alunos em 2009, chegou a 40,5% em 2019, um aumento de quase 10 pontos percentuais. Naquele mesmo ano, 11,4% das crianças do ensino fundamental deixaram a escola por insegurança, o dobro na comparação com 2009.
O psicólogo Eduardo Pedroso, mestre em educação e especialista em psicologia educacional, chama atenção para os impactos dessa violência sobre crianças e adolescentes. “Do ponto de vista psicológico, sabemos que o desenvolvimento intelectual e emocional da criança se dá nas interações sociais. Em um ambiente violento, a criança deixa de se desenvolver porque vive em alerta, não aprende, e ela não aprende quem ela pode ser no mundo, mas, sim, que precisa de algum tipo de recurso para se defender. Esse estado de alerta pode gerar nela depressão, ansiedade, pode gerar vários fatores emocionais que são prejudiciais”, alerta. Eduardo destaca ainda que a violência escolar também afeta professores, comprometendo a sua capacidade de estabelecer vínculos afetivos e educativos com os alunos.
O artigo da Fapesp ainda faz referência ao material didático que desconsidera, por exemplo, questões de diversidade racial. Esta seria uma violência chamada de institucional.
O professor Daniel Cara, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, explica que isso também acontece quando as escolas valorizam apenas o conteúdo das matérias. “A missão da educação é o pleno desenvolvimento da pessoa”, afirma.
Segundo o psicólogo Eduardo Pedroso, quando a escola falha em oferecer experiências de cooperação e de escuta dos alunos, ela impede a formação de pessoas críticas que valorizam a paz e a violência se reproduz. Foram 47 vítimas fatais nas escolas desde 2001, de acordo com os dados apresentados pela Fapesp.
O professor Daniel Cara diz que a gestão democrática da escola é a forma mais rápida de estancar o problema.
O artigo aponta que a violência escolar tem diversas causas, entre elas, a banalização do bullying, o ódio nas redes sociais e o despreparo das escolas para lidar com discriminações, como o racismo. A desvalorização dos professores e o extremismo político, que aumentou a intolerância entras as pessoas, também são causas mencionadas. Além disso, a violência contra crianças e jovens em casa, que dobrou entre 2009 e 2019, se transforma em atos violentos nas escolas, como forma de revidar a agressão sofrida no lar.
Os dados reforçam a importância de ações de combate ao bullying, ao racismo e à violência doméstica. O estudo aponta também a necessidade de implementar equipes multidisciplinares nas escolas — com psicólogos, agentes sociais, conselheiros tutelares, entre outros. O artigo destaca ainda a necessidade de um trabalho de inteligência dos agentes de segurança pública no apoio à comunidade onde a escola se encontra.